Guerra dos Farrapos
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Intervenientes
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República Rio-Grandense
República Juliana voluntários italianos |
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Principais líderes
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Forças
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40.000+ separatistas
republicanos
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60.000+ soldados imperiais
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Guerra
dos Farrapos ou Revolução
Farroupilha são os nomes pelos quais ficou conhecida a revolução
ou guerra
regional, de caráter republicano, contra o governo imperial do Brasil[1][2],
na então província de São Pedro do
Rio Grande do Sul[3],
e que resultou na declaração de independência da província
como estado republicano, dando origem à República Rio-Grandense[4].
Estendeu-se de 20 de setembro de 1835 a 1°
de março de 1845
A
revolução, de caráter separatista, influenciou movimentos que ocorreram em
outras províncias brasileiras: irradiando influência para a Revolução Liberal
que viria a ocorrer em São
Paulo em 1842 e para a Revolta denominada Sabinada na Bahia em 1837, ambas de
ideologia do Partido Liberal da época. Inspirou-se na recém
findada guerra de independência do Uruguai, mantendo conexões com a nova
república do Rio da Prata, além de províncias independentes
argentinas, como Corrientes e Santa Fé. Chegou a expandir-se à costa
brasileira, em Laguna, com a proclamação da República Juliana e ao planalto catarinense de Lages. Teve como
líderes: general Bento Gonçalves, general Neto, coronel Onofre
Pires, coronel Lucas de Oliveira, deputado Vicente da Fontoura, Pedro
Boticário, general Davi Canabarro, coronel Corte Real, coronel Teixeira
Nunes, coronel Domingos de Almeida, major Vicente Ferrer de Almeida,coronel Domingos Crescêncio de Carvalho,
general José Mariano de Mattos, general Gomes
Jardim [5],
além de receber inspiração ideológica de italianos da Carbonária
refugiados, como o cientista e tenente Tito Lívio Zambeccari e o jornalista Luigi
Rossetti[6],
além do capitão Giuseppe Garibaldi, que embora não pertencesse a
carbonária,
esteve envolvido em movimentos republicanos na Itália.[7].
A questão da abolição da escravatura também esteve envolvida,
organizando-se exércitos contando com homens negros que aspiravam à liberdade.[8][9]
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Antecedentes e causas
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- Império - |
Primeiro Reinado
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Guerra da Independência:
1822-1823
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Independência da Bahia: 1821-1823
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Confederação do Equador: 1824
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Guerra contra as Províncias Unidas:
1825-1828
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Revolta dos Mercenários: 1828
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Período Regencial
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Federação do Guanais: 1832
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Revolta dos Malês: 1835
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Cabanagem:
1835-1840
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Farroupilha: 1835-1845
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Sabinada:
1837-1838
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Balaiada:
1838-1841
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Segundo Reinado
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Revoltas Liberais: 1842
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Revolta
Praieira: 1848-1850
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Guerra contra Oribe e Rosas: 1851-1852
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Ronco da Abelha: 1835-1845
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Questão Christie: 1863
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Guerra contra Aguirre: 1864
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Guerra do Paraguai: 1864-1870
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Questão Religiosa: 1872-1875
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Revolta dos Muckers: 1874
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Revolta do Quebra-Quilos: 1874-1875
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Questão Militar: década de 1880
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A
justificativa original para a revolta baseia-se no conflito político entre os
liberais, que propugnavam modelo de estado com maior autonomia às províncias[10],
e o modelo imposto pela constituição de D.
Pedro I, de caráter unitário. Além disso, havia disseminação de ideais
separatistas, tidos por muitos gaúchos como o melhor caminho para a paz e a
prosperidade, seguindo o exemplo da Província Cisplatina.
O
movimento também encontrou forças na posição secundária, tanto econômica como
política, que a Província de São Pedro do Rio
Grande ocupava no Brasil, nos anos que se sucederam à Independência. Diferentemente de outras
províncias, cuja produção de gêneros primários se voltava para o mercado
externo, como o açúcar e o café, a do Rio Grande do Sul produzia principalmente para o
mercado interno. Seus principais produtos eram o charque e o couro, altamente tributados.[10]
As charqueadas produziam para a alimentação dos escravos africanos, indo
em grande quantidade para abastecer a atividade mineradora
nas Minas
Gerais, para as plantações de cana-de-açúcar e para a região sudeste, onde se
iniciava a cafeicultura[5].
A região, desse modo, encontrava-se muito dependente do mercado brasileiro de charque, que com
o câmbio supervalorizado, e benefícios tarifários,
podia importar o produto por custo mais baixo[11].
Além disso, instalava-se nas Províncias Unidas do Rio da Prata
uma forte indústria saladeiril, da qual participava Rosas, e que, junto
com os saladeros do Uruguai, que deixara de ser brasileiro depois da Guerra da Cisplatina, competiria pela compra
de gado da região, pondo em risco a viabilidade econômica das charqueadas sul-rio-grandenses.
Consequentemente, o charque rio-grandense tinha preço maior do que o similar
oriundo da Argentina
e do Uruguai,
perdendo assim competitividade no mercado interno.[12]
A tributação da concorrência externa era uma exigência dos estancieiros e
charqueadores[11].
Essa tributação não era do interesse dos principais compradores brasileiros que
eram os que detinham as concessões das lavras de mineração, os produtores de cana-de-açúcar e os cafeicultores,
pois veriam reduzida a lucratividade das mesmas, por maior dispêndio na
manutenção dos escravos.
Há que
considerar, ainda, que o Rio Grande do Sul era região fronteiriça aos domínios
hispânicos situados na região platina. Devido às disputas territoriais nessa
área, nunca fora uma Capitania Hereditária no período colonial e,
sim, parte de seu território, desde o século
XVII ocupado por um sistema de concessão de terras a chefes militares.
Esses dispunham de capacidade de opor-se militarmente ao fraco exército
imperial na região. Ainda mais, na então ainda recente e desastrosa Guerra da Cisplatina, que culminou com a perda
da área territorial do Uruguai, anteriormente anexada ao Brasil, as posições
dos militares e caudilhos locais foram sobrepujadas por comandos oriundos da
corte imperial (como o Marquês de Barbacena). Os contatos frequentes,
inclusive negócios do outro lado da fronteira, mostraram aos caudilhos locais
as vantagens de uma república, com suas bandeiras de igualdade, liberdade e
fraternidade trazidas da Revolução Francesa[5].
Além disso a imposição de presidentes provinciais por parte do Governo imperial
ia contra o direcionamento político da Assembleia Legislativa Provincial
do Rio Grande do Sul, criando mais um motivo de desagrado da elite regional.[10]
Também
é preciso citar o conflito ideológico presente no Rio
Grande do Sul, que havia sofrido diversas tentativas menores de criação de
uma república, iniciando com as tentativas insanas de Alexandre Luís de Queirós e
Vasconcelos, que proclamou a república três vezes no início do século
XIX[13],
ou a Sedição de 1830, que visava a substituir a
monarquia pela república em
Porto Alegre e que teve a participação de diversos imigrantes
alemães (Otto
Heise, Samuel Gottfried Kerst e Gaspar Stephanousky),
mas foi prontamente sufocada [14].
O
descontentamento reinante na província foi objeto de diversas reuniões
governamentais, especialmente a partir de 1831, quando começam a circular
insistentes boatos sobre a separação da província visando a unir-se ao Estado Oriental,
também preocupados com informações de que, na fronteira, se pregava a
revolução, sendo prometida a liberdade aos escravos.[13]
No Uruguai vivia refugiado o padre Caldas, revolucionário da confederação do Equador, que mantinha um
jornal de idéias republicanas, além de animada correspondência com os
comandantes da fronteira, incluindo Bento Gonçalves.[15]
O
conflito ideológico foi exacerbado com a criação da Sociedade
Militar[16],
no Rio de Janeiro, um clube com simpatia pelo Império e fomentador da
restauração de D. Pedro I no trono brasileiro[15].
Um dos seus líderes foi o Conde de Rio Pardo, que ao chegar a Porto Alegre
em outubro de 1833,
fundou ali uma filial. Os estancieiros rio-grandenses não viam com bons olhos a Sociedade
Militar e pediam que o governo provincial a colocasse na ilegalidade. Entre
os protestos eclodiu uma rebelião popular, liderada pelos majores José Mariano de Matos e João Manuel de Lima e Silva que foi
logo abafada e seus líderes punidos.
Os Farrapos
Farrapos ou farroupilhas
foram chamados todos os que se revoltaram contra o governo imperial, e que
culminou com a Proclamação da República
Rio-Grandense. Era termo considerado originalmente pejorativo, já utilizado
pelo menos uma década antes da Guerra dos Farrapos para designar os
sul-rio-grandenses vinculados ao Partido Liberal, oposicionistas e radicais ao
governo central, destacando-se os chamados jurujubas. O termo, oriundo
do parlamento, com o tempo foi adotado pelos próprios revolucionários, de forma
semelhante à que ocorreu com os sans-cullotes
à época da Revolução Francesa. Seus oponentes imperiais
eram por eles chamados de caramurus ou camelos[6],
termo jocoso em geral aplicado aos membros do Partido Restaurador no Parlamento Imperial.
Em 1831, no Rio de
Janeiro, havia os jornais Jurujuba dos Farroupilhas e Matraca dos
Farroupilhas. Em 1832
foi fundado o Partido Farroupilha pelo tenente Luís José dos Reis Alpoim, deportado do
Rio para Porto Alegre. O grupo se encontrava na casa do major João Manuel de Lima e Silva (tio de Luís Alves de Lima e Silva, que viria a
ser o Duque de Caxias), casa esta que era sede também da Sociedade Continentino, editora do jornal O
Continentino, ferrenho critico ao Império[12].
Em 24
de outubro de 1833,
os farroupilhas promoveram um levante contra a instalação da Sociedade
Militar em Porto Alegre.[17].
Inicialmente,
reivindicavam a retirada de todos os portugueses que se mantinham nos mais
altos cargos do Império e do Exército, mesmo depois da Independência,
respaldados pelo Partido Restaurador ou caramuru. Os
caramurus almejavam a volta de D. Pedro I ao governo do Brasil.
No
entanto, é bom notar que entre os farrapos havia os que acreditavam que só
tornando suas províncias independentes poderiam obter uma "sociedade
chula", ou seja, administrada por provincianos. Havia, portanto,
estancieiros, estancieiros-militares, farroupilhas-libertários,
militares-libertários, estancieiros-farroupilhas, abolicionistas e escravos que
buscavam a liberdade, e assim por diante, numa combinação e interpenetração ideológica
sem fim. Inicialmente nem todos eram republicanos e separatistas, mas os
acontecimentos e os novos rumos do movimento conduziram a esse desfecho.
A maçonaria
sulista, tendendo aos ideais republicanos[18],
teve importante papel nos rumos tomados, sendo que muitos dos líderes
farroupilhas foram seus adeptos, dentre eles, Bento Gonçalves da Silva, com o
codinome Sucre.[12]
Bento organizou outras lojas maçônicas no território rio-grandense, o que lhe
havia sido permitido desde o ano de 1833.[12]
A Revolta Farroupilha
Lenço Farroupilha. Acervo do Museu Júlio de
Castilhos
No ano
de 1835 os ânimos
políticos estavam exaltados. O descontentamento de estancieiros, liberais,
industriais do charque e militares locais promoviam reuniões em casas de
particulares, destacando-se a figura de Bento
Gonçalves. Naquele ano foi nomeado como presidente da Província Antônio Rodrigues Fernandes Braga,
que chegara ao posto pela indicação de Bento Gonçalves e, apesar de ser
rio-grandense, passara tanto tempo servindo o Império na Europa e nos Estados
Unidos, logo após seus estudos em Coimbra, que não tinha laços suficientemente
sólidos estabelecidos no Rio Grande.[19]
Fernandes Braga, apesar de inicialmente ter agradado aos liberais, logo entrou em atrito. Na sessão
inaugural da Assembleia Provincial, perante uma plateia majoritariamente
hostil, acusou os liberais extremados de planejarem separar o Rio Grande do Sul
do Império e uni-lo ao Uruguai[20],
mencionando Bento Gonçalves[15]
e referindo-se também a Lavalleja e ao seu mentor, o indigno Padre Caldas[13].
Houve protestos e contra-protestos em sessões seguidas, Fernandes Braga ainda
tentou corrigir-se e apaziguar os ânimos, mas já era tarde demais.[15]
Na
noite de 18 de setembro de 1835, em uma reunião
onde estavam presentes José Mariano de Mattos (um ferrenho
separatista), Gomes Jardim (primo de Bento e
futuro presidente da República Rio-Grandense), Vicente da Fontoura (farroupilha, mas
anti-separatista), Pedro Boticário (fervoroso farroupilha), Paulino da Fontoura (irmão de Vicente, cuja
morte seria imputada a Bento Gonçalves, estopim da crise na República), Antônio de Sousa Neto (imperialista e
farroupilha, mas que simpatizava com os ideais republicanos) e Domingos José de Almeida (separatista e
grande administrador da República), decidiu-se por unanimidade que dentro de
dois dias, no dia 20 de setembro de 1835, tomariam militarmente Porto
Alegre e destituiriam o presidente provincial Antônio Rodrigues Fernandes Braga.
Em
várias cidades do interior as milícias foram alertadas para deflagrarem a
revolta. Bento comandava uma tropa reunida em Pedras
Brancas, hoje cidade de Guaíba.[15]
Gomes
Jardim e Onofre Pires comandavam os farroupilhas aquartelados,
com cerca de 200 homens, no morro da Azenha[15],
o atual cemitério São Miguel e Almas. Também
mantinham, no dia 19 de setembro de 1835, um piquete com 30 homens nas
imediações da ponte da Azenha[5],
comandado por Manuel Vieira da Rocha, o cabo Rocha,
que aguardava o amanhecer do dia 20 para investir, junto com o restante da
tropa, contra os muros da vila. Porém Fernandes Braga ouvira alguns boatos e,
desconfiado, mandou uma partida de 9 homens sob o comando de José Gordilho de Barbuda Filho, o 2°
visconde de Camamu, fazer um reconhecimento durante à noite. Descuidados e
inexperientes, os guardas imperiais se deixaram notar e foram atacados pelo
piquete republicano e fugiram, resultando 2 mortos e cinco feridos. Um dos
feridos, o próprio visconde, sujo e ensanguentado alertou Fernandes Braga da
revolta.[15]
Eram 11 horas da noite de 19 de setembro de 1835.
Regente Imperial Padre Feijó
Fernandes
Braga ainda tentou organizar uma resistência e, ao amanhecer, estava junto ao arsenal de
guerra, hoje ponta do Gasômetro, tentando reunir homens para a resistência.
Porém, até o meio da tarde somente 17 homens se apresentaram para defender a
cidade, pois o 8° Batalhão de Caçadores, comandado por João Manuel de Lima e
Silva havia se declarado revolucionário[15].
Vendo a escassez de armas e munição, Braga resolveu fugir[5]
a bordo da escuna Rio-Grandense[15][21],
seguido pela canhoneira 19 de Outubro, indo parar em Rio Grande,
então maior cidade da Província, não sem antes voltar ao palácio do Governo,
pegar alguns documentos e todo o dinheiro dos cofres provinciais.
Os
farroupilhas adiaram a investida combinada, devido ao inusitado da noite
anterior. Somente ao amanhecer o dia 21 de
setembro de 1835[11],
chegaram às portas da cidade Bento Gonçalves e os demais comandantes, seguidos
por suas respectivas tropas. Porto Alegre abandonada, sem resistência,
entregou-se aos revolucionários. No resto da província apenas alguns focos de
resistência em Rio Pardo
e São Gabriel, além de Rio Grande, mantinham os farroupilhas ocupados.
A Câmara Municipal reuniu-se extraordinariamente
para ocupar o cargo de Presidente. Na ausência dos vice-presidentes imediatos,
assumiu o quarto vice, Dr. Marciano Pereira Ribeiro.[22]
Em 25
de setembro Bento Gonçalves expediu uma carta ao Regente Imperial, padre Diogo Antônio Feijó, explicando os motivos da
revolta e solicitando a nomeação de um novo Presidente e comandante das armas.[15]
Os revoltosos davam, então, o conflito por encerrado.[15]
A reação imperial
De Rio Grande,
Fernandes
Braga embarcou para o Rio de Janeiro em 23 de
outubro[5],
capital do Império do Brasil. Uma vez na Corte, Braga passou a sua versão da
história, bastante diferente da carta enviada por Bento
Gonçalves. O novo indicado, José de Araújo Ribeiro[22],
veio acompanhado de um verdadeiro aparato de guerra: onze brigues e escunas, além de
diversas canhoneiras,
lanchas e iates[21],
carregados de armamento e muitos soldados imperiais, sob o comando do capitão de mar e guerra John Pascoe Grenfell.
Araújo
Ribeiro chegou a Porto Alegre no início de dezembro, devendo tomar posse em 9 de
dezembro.[15]
Uma confusão em relação ao papel de Pereira Duarte no apoio à causa farroupilha
fez com que fosse adiada a posse, retirando-se Araújo Ribeiro para Rio Grande,
com intenção de retornar à Corte.[15]
Lá foi convencido por Bento Manuel e outros amigos a permanecer, com a promessa
de apoio à Presidência[15],
tomando então posse perante a Câmara Municipal de Rio Grande, em 15 de
janeiro de 1836[5].
Bento Manuel, que havia apoiado a revolta inicial e ainda iria trocar de lado
na disputa duas vezes, deslocou-se para o interior e depois para Porto Alegre
com o intuito de cercá-la.[15]
Os liberais receberam a posse de Araújo Ribeiro como declaração de guerra,
reunindo seus soldados que estavam dispersos desde outubro, sob a presidência
de Marciano Ribeiro.[15]
Como
Presidente Imperial da Província, Araújo Ribeiro tratou de recompor seu
exército, reunindo oficiais gaúchos contrários aos farroupilhas, como João da Silva Tavares, Francisco Pedro de Abreu (o Chico Pedro
ou Moringue), Manuel Marques de Sousa, mais tarde conde de Porto Alegre, Bento Manuel Ribeiro[23],
Manuel Luís Osório (hoje patrono da cavalaria do
Brasil), e até mesmo contratando mercenários
vindos do Uruguai.
Administrativamente mandou fechar a Assembleia Provincial e destituiu Bento
Gonçalves do comando da Guarda Nacional, nomeação feita por Marciano José Pereira Ribeiro,
desautorizando-o. Iniciou-se aí a resistência em Rio Grande e a
perseguição aos revoltosos.
Em
abril de 1836, o
comandante-das-armas farroupilhas, João Manuel de Lima e Silva, prendeu o
major Manuel Marques de Sousa, que foi trazido junto com os demais prisioneiros
para o navio-prisão Presiganga. Na noite de 15 de junho
de 1836, com a ajuda
de um guarda corrupto, os prisioneiros foram soltos e, sob o comando de Marques
de Sousa e com ajuda de Bento Manuel, os Imperiais retomaram a cidade de Porto
Alegre das mãos dos farroupilhas.[5][15]
Foram presos Marciano Ribeiro, Pedro
Boticário e mais 32 revoltosos.[15]
Dias
depois, Bento Gonçalves tentou retomar a capital, mas foi rechaçado e começou
uma série de sítios ao redor da cidade que terminou definitivamente somente em
dezembro de 1840.[24]
Sem o controle da capital e do único porto marítimo da província, os revoltosos
estabeleceram quartel-general na cidade de Piratini.
Em 21 de
agosto, as tropas navais de Grenfell têm sua primeira vitória, com a tomada
do forte
do Junco[25],
num ataque comandado pelo capitão-tenente Guilherme Parker[21],
com o brigue-escuna Leopoldina, o patacho Vênus
e seis canhoneiras, além de uma tropa de infantes
comandados pelo coronel
Francisco Xavier da Cunha[26].
Cinco dias depois, o forte de Itapoã foi conquistado, deixando aberto
aos imperiais o acesso fluvial a Porto Alegre.[26]
A proclamação da República
República Rio-Grandense
Proclamação da República Piratini, 1915, por Antônio Parreiras.
No
início de setembro de 1836
Antônio de Sousa Neto deslocou-se à região de
Bagé, onde o imperial João da Silva Tavares, vindo do Uruguai, mantinha
o desassossego entre os farroupilhas residentes.[15]
A Primeira Brigada de Neto, com 400 homens atravessou o arroio
Seival e encontrou as tropas de Silva Tavares (560 homens) sobre uma
coxilha. Era a tarde de 10 de setembro de 1836 quando começou a batalha
do Seival. Silva Tavares desceu a coxilha em desabalada carga. Neto ordenou
também a carga de lança e espada, sem tiros. As forças se encontraram em
sangrento combate. Silva Tavares fugiu e seus homens foram derrotados[5].
Os farrapos
ficaram quase intactos, enquanto do outro lado havia 180 mortos, 63 feridos e
100 prisioneiros.
Donos
do campo, os farroupilhas comemoraram vibrantemente a vitória. Cresceu
a vontade separatista de conquistar e manter um país rio-grandense
independente, entre as nações do mundo. À noite as questões ideológicas foram
revistas e Lucas de Oliveira e Joaquim
Pedro, republicanos ardorosos, catequizaram Neto,[15]
argumentando que não havia outra saída a não ser enveredar pela senda da
independência e que não havia outro desejo popular a não ser o desejo de
liberdade, de abolição da escravatura e de democracia
sob o sistema republicano. Se tivesse que acontecer, a hora era aquela,
a hora da vitória, do júbilo, da afirmação. Neto passou a simpatizar com a
ideia, mas resistiu diante de uma provável reprovação de seus pares. Pensava que
tal proclamação de uma nova República deveria partir de Bento Gonçalves, o
grande comandante de todos os farrapos. Contrapuseram que Bento já se decidira
pela República,
que hierarquia rígida era coisa do Império e
que o sistema republicano centrava-se no povo, suas vontades e necessidades, e
não na elite governativa.
Finalmente,
aquiescendo o Coronel Neto, passaram a escrever a Proclamação da República
Rio-Grandense que seria lida e efetivada por ele, perante a tropa perfilada,
em 11
de setembro de 1836[11].
Azevedo Dutra: Retrato de Antônio de Sousa Netto, século XIX. Acervo
do Museu Júlio de Castilhos
Após a
cerimônia de Proclamação, irromperam todos em gritos de euforia, liberdade e
vivas à República, com tiros para o alto e cantorias. Logo chegou a galope o
tenente Teixeira Nunes, empunhando pela primeira vez a bandeira tricolor,
mandada fazer às pressas em Bagé e passa a desfilar por entre seus companheiros
com a bandeira verde, vermelha e amarela da República Rio-Grandense, comemorando sua
independência.
Foram
conclamadas as demais províncias brasileiras a unirem-se como entes federados
no sistema republicano[15],
foi criado um hino nacional e bandeira própria do novo estado, até hoje
cultivados pelo Estado do Rio Grande do Sul. Também foi estabelecida a capital
na pequena cidade de Piratini, donde surgiu uma nova alcunha, a República de Piratini.
A
partir deste momento, ocorreu a falência imediata da Revolta Farroupilha e o
início da Guerra dos Farrapos propriamente dita. A mudança de posicionamento
dos Farrapos foi imediata.
- Já não desejavam mais substituir o
Presidente da Província de São Pedro do Rio Grande
por outro, pois agora haveriam de ter um Presidente da República independente.
- Os combatentes não era mais
revoltosos farroupilhas, mas soldados do Exército Republicano
Rio-Grandense.
- O pavilhão que defendiam não era mais
a bandeira imperial verde-amarela, mas a quadrada bandeira republicana
verde, vermelha e amarela em diagonal (sem o brasão no meio).
- Não lutavam mais por reconhecimento e
atenção, mas pela defesa da independência e soberania de seu país.
- Já não era mais a luta de revoltosos
em busca de justiça, mas uma guerra de exército defensor (republicano)
contra exército agressor (imperial);
A
república Rio-grandense tinha escasso apoio nas áreas colonizadas pela recente imigração alemã. Esses imigrantes haviam
se fixado na desativada Real Feitoria do Linho Cânhamo em
colônias cedidas pelo Império, no Vale do Rio dos
Sinos. Em Porto Alegre, apesar da simpatia de parte das camadas
médias, não recebia o apoio popular, que mobilizava outras cidades da Província de São Pedro do Rio
Grande. Inicialmente sua base social era originária de liberais, militares,
industriais do charque e, especialmente, de estancieiros
com capacidade de liderar exércitos particulares de "peões",
vaqueiros que lhes prestavam serviços ou deles dependiam para subsistência e
defesa e cuja obediência e fidelidade era garantida por traços feudais da
cultura local; e por escravos, que no meio rural eram incluídos no convívio
social dos peões. Como havia interfaces com o Uruguai, também
eram contratados elementos de lá provenientes. Os exímios cavaleiros forjados
nas lides campeiras, chamados "gaúchos",
formavam corpos de cavalaria de choque aptos a travar uma guerra de guerrilha.
Esses exércitos dispunham de alta mobilidade e conhecimento do terreno, mas sem
dispor de infantaria
nem adequada artilharia, os Farroupilhas tinham fraca capacidade bélica
contra as cidades fortificadas do Rio Grande e Porto Alegre, e pouca capacidade
de defesa das praças que controlavam.
Batalha do Fanfa
Cena de Batalha no Sul do Brasil, por Oscar Pereira da Silva.
No dia
12
de setembro, um dia após a Proclamação da República
Rio-Grandense por Antônio de Sousa Neto, a seguir à vitória na Batalha
do Seival, houve a solenidade de lavratura e assinatura da Ata de
Declaração de Independência, pela qual os abaixo-assinantes declaravam não
embainhar suas espadas, e derramar todo o seu sangue, antes de retroceder de
seus princípios políticos, proclamados na presente declaração. Fizeram-se
várias cópias da Ata, que foram enviadas às câmaras municipais e aos principais
comandantes do Exército Republicano.
Como
resposta imediata, as câmaras de Jaguarão, Alegrete, Cruz Alta, Piratini, entre
outras, convocaram sessões extraordinárias, onde puderam analisar e corroborar
os feitos, fazendo constar em Atas Legislativas suas adesões, proclamando a independência
política da Província, por ser a vontade geral da maioria.
Bento
Gonçalves não pudera estar presente devido a um fato circunstancial. Ao tomar
conhecimento do ato da Proclamação da República Rio-grandense, Bento Gonçalves
levantou seu acampamento na lomba do Tarumã[27]
, parte do sítio que impingia a Porto
Alegre, seguiu a várzea do Rio
Gravataí, marchou para São
Leopoldo e cruzou o rio dos Sinos e o rio Caí,
passou a deslocar-se beirando o Rio Jacuí,
para junção de forças com Neto [17].
Fatalmente ele precisava atravessar o rio na Ilha de
Fanfa, no município de Triunfo, por causa da época de cheias.
Ciente dos acontecimentos, Bento Manuel, agora a serviço do Império,
deslocou suas tropas com 660 homens embarcados, a partir de Triunfo, de modo a
impedir a passagem de Bento Gonçalves[17].
Bento
Gonçalves decidiu cruzar o rio Jacuí para unir suas tropas com as de Domingos Crescêncio. Na noite de 1°
de outubro, levantou acampamento e, na manhã seguinte, iniciou, com dois
pontões para 40 homens, o cruzamento para a Ilha do Fanfa[17].
José de Araújo Ribeiro, alertado por Bento
Manuel , enviou a Marinha,
comandada por John Grenfell no vapor
Liberal[21],
junto com 18 barcos de guerra, escunas e canhoneiras guardando o lado sul da Ilha, só percebida
pelos Farrapos depois de estarem na ilha. Fechando o cerco por terra, Bento
Manuel ficou senhor da situação. Era 3 de
outubro de 1836.
Os
farrapos resistiram por três dias[15]
e, sabedores da proximidade das tropas de Crescêncio de Carvalho, repeliram os
fuzileiros que desembarcavam na ilha pela costa sul e qualquer tentativa de
travessia pelo norte. A fim de evitar mais derramamento de sangue, Bento Manuel levantou a bandeira de
“parlamento” e Bento Gonçalves aceitou negociar. O acordo foi feito e assinado
em 4
de outubro.[15][21]
Os Farrapos entregariam as armas, capitulariam e voltariam livres para suas
casas. Segundo Bento Manuel, a guerra estaria terminada, com a vitória do
Império. Ele pacificara a Província e receberia as glórias da Corte. Porém,
Bento Gonçalves não era tão ingênuo e já havia enviado um mensageiro
solicitando socorro a Neto e Canabarro.[15]
Depois
de desarmar e soltar os soldados, Bento Manuel manteve os chefes presos[17]:
Bento Gonçalves, Tito Lívio, José de Almeida Corte Real, José
Calvet, Onofre Pires, entre outros[17],
sob o pretexto de que Bento Gonçalves havia faltado com sua palavra ao enviar
emissários buscando socorro.[15]
A maior parte dos líderes do movimento foi presa na Presiganga,
depois enviada à Corte e por fim encarcerada na prisão de Santa Cruz e no Forte
da Laje, no Rio de Janeiro[17].
A Guerra sem Bento
Na
sessão extraordinária da Câmara de Piratini, na
primeira capital da República Rio-Grandense, em 6 de
novembro de 1836[23],
procedeu-se formalmente a votação para Presidente da República, conforme os parâmetros
da época. A eleição foi vencida por Bento Gonçalves (mesmo sem estar presente e
sem campanha) e primeiro vice-presidente José Gomes de Vasconcelos Jardim.[15]
Assumiu o vice interinamente a presidência, nomeando o ministério[15]
e tomando a incumbência de convocar uma Assembleia Constituinte para formar a Constituição da República
Rio-grandense.
A luta
entre Farroupilhas e Imperiais continuou acirrada. O Império despejava rios de
dinheiro para recrutar mais e mais soldados paulistas e baianos, para comprar
mais armas, mais munições, com pouquíssimo resultado prático.
Pelo
lado imperial, Araújo Ribeiro foi substituído a 5 de
janeiro de 1837 pelo brigadeiro Antero
de Brito, acirrando mais a disputa. Bento Manuel não gostou da demissão de
seu parente e amigo [23]
e enviou uma carta a Antero de Brito, dizendo-se doente e solicitando que
portanto fosse substituído no comando das armas. Além disso, dispensou boa
parte da tropa que comandava.[23]
Brito
passou a acumular os cargos de Comandante das Armas e de Presidente da Província de São Pedro do Rio
Grande, com capital em Porto Alegre. Se Araújo era, acima de tudo,
conciliador, Brito perseguiu e prendeu até mesmo civis simpatizantes das ideias
farroupilhas, confiscando seus bens; alguns destes foram punidos com a pena de
desterro. Em contrapartida, os Farrapos eram senhores do pampa, recebiam
maciças adesões de militares descontentes com a nomeação de Brito e, ainda em
janeiro de 1837, ganharam o apoio dos habitantes de Lages de Santa
Catarina, que seria um importante ponto onde os Farrapos
comprariam armas e munições. O principal perseguido por Antero de Brito era o
Comandante das Armas Imperiais anterior a ele, nada menos que Bento Manuel Ribeiro.[15]
Bento
Manuel não aceitava a auto-nomeação de Brito e continuava a dar suas próprias
ordens às tropas.[15]
Brito, então, saiu pessoalmente ao seu encalço. Bento fugiu mudando de direção,
como numa brincadeira de gato e rato, situação que se arrastou até o dia 23 de
março de 1837,
quando, num golpe de mestre, Bento Manuel Ribeiro deixou um piquete para trás,
sob o comando do major Demétrio Ribeiro que, de surpresa, caiu sobre as
tropas de Brito e prendeu o Presidente Imperial da Província.[23]
Com isso, novamente Bento Manuel foi aceito no seio farrapo, passando a
combater novamente os imperiais.[15]
Em 8 de abril,
o general Neto conquistou Caçapava do Sul, centro de reabastecimento imperial[5],
depois de sete dias de cerco, apreendendo 15 canhões e fazendo prisioneiros a
540 imperiais, comandados pelo coronel João Crisóstomo da Silva[17][23].
Ainda neste ano, em 2 de julho, aconteceu o Combate de Ivaí, onde Bento
Manuel foi capturado, mas após um ataque farroupilha 50 legalistas foram
mortos, enquanto o marechal Sebastião Barreto Pereira Pinto
fugiu para Caçapava do Sul[28],
deixando Bento Manuel ferido e desacordado no campo[23].
A sustentação
econômica da República era propiciada pelo apoio da vizinha República Oriental do Uruguai, que
permitia o comércio do charque produzido pelos rio-grandenses para o próprio
Brasil. A exportação era feita por terra até o Porto de Montevidéu
ou pelo rio
Uruguai. Em 29 de agosto foi assassinado o coronel João Manuel de
Lima e Silva, que havia derrotado Bento Manoel Ribeiro, no ano anterior[17].
Gonçalves assume a presidência
Retrato de Bento Gonçalves, século XIX. Acervo do Museu Júlio de Castilhos
Em 15 de
março de 1837,
Bento Gonçalves tentou escapar da prisão, no Rio de Janeiro, junto de outros
companheiros. Porém Pedro Boticário não conseguiu passar por uma janela, por
ser muito gordo,
e, em solidariedade, Bento Gonçalves desistiu da fuga, na qual escaparam Onofre
Pires e o coronel Corte Real.[15]
Depois desta tentativa de fuga, foi transferido para a Bahia, onde chegou em 26 de
agosto de 1837,
ficando preso no Forte do Mar. Conseguiu, com auxílio da Maçonaria,
evadir-se da prisão baiana em 10 de
setembro de 1837,
poucos dias antes do início da Sabinada. Permaneceu algum tempo, clandestino, em Itaparica e Salvador,
onde teve contato com membros do movimento.[29]
Depois de despistar seus perseguidores, que achavam que tinha partido para os Estados
Unidos em uma corveta[15],
chegou, via Buenos Aires[11],
de volta ao Rio Grande do Sul e, em 16 de
dezembro de 1837, tomou posse como Presidente da República.[30]
Nesta época os farrapos dominavam praticamente toda a província[15],
ficando os imperiais restritos a Rio Grande e São José do Norte.[21]
A 29 de
agosto de 1838 Bento lançou seu mais importante manifesto aos
rio-grandenses, onde justificava as irreversíveis decisões tomadas em favor da
libertação do seu povo:
“
|
Toma na extensa escala dos estados soberanos o lugar
que lhe compete pela suficiência de seus recursos, civilização e naturais
riquezas que lhe asseguram o exercício pleno e inteiro de sua independência,
eminente soberania e domínio, sem sujeição ou sacrifício da mais pequena
parte desta mesma independência ou soberania a outra nação, governo ou
potência estranha qualquer. Faz neste momento o que fizeram tantos outros
povos por iguais motivos, em circunstâncias idênticas.
|
”
|
E no
trecho final, um juramento importante:
“
|
Bem penetrados da justiça de sua santa causa,
confiando primeiro que tudo, no favor do juiz supremo das nações, eles têm
jurado por esse mesmo supremo juiz, por sua honra, por tudo que lhes é mais
caro, não aceitar do governo do Brasil uma paz ignominiosa que possa
desmentir a sua soberania e independência.
|
”
|
Estas
palavras têm reflexo mais tarde, quando da assinatura do Tratado de Poncho Verde.
Queda da "Tranqueira Invicta"
Ver artigo principal: Forte Jesus, Maria, José do Rio
Pardo
Com a
dificuldade em quebrar a resistência de Porto Alegre, os farroupilhas
resolveram voltar-se contra Rio Pardo[15],
onde estava concentrada uma divisão do exército imperial, com dois batalhões de
infantaria e dois corpos de cavalaria[23],
comandada pelo marechal Sebastião Barreto Pereira Pinto. Os
brigadeiros Francisco Xavier da Cunha
comandando a infantaria e Bonifácio Calderón a cavalaria, num total de
1.200 combatentes. A cidade era, junto com Porto Alegre e Rio Grande, uma das
mais importantes do estado, contando com quase o dobro de habitantes da capital[30].
A
concentração de tropas imperiais chamou a atenção dos farroupilhas, conscientes
das possíveis consequências desta tropa quando se movimentasse[30].
Bento Manuel Ribeiro, ao lado de Antônio de Sousa Neto, em 30 de abril
de 1838, comandando
2.500 homens, 800 deles de cavalaria, surpreenderam a cidade, na batalha do
Barro Vermelho, na entrada da cidade[30],
derrotando os imperiais, conquistando Rio Pardo,
a ex-tranqueira invicta, matando 71 homens e fazendo mais de 130 prisioneiros.
Este
fato foi importante por vários aspectos, dando novo impulso à rebelião.[23]
Rio Pardo formava, com Rio Grande e Porto
Alegre, a fronteira de domínio imperial, um ponto de apoio para a conquista
do interior, tinha fama de inexpugnável e a vitória farrapa foi incontestável.
Além disso, Rio Pardo tinha quase o dobro de habitantes de Porto Alegre.[30]
A
conquista de Rio Pardo foi importante também porque lá se encontrava, na ocasião,
a Banda Imperial, sob o comando do maestro mineiro Joaquim José Mendanha, que viria a compor,
sob a encomenda de Bento Gonçalves, o Hino Nacional da República Rio-Grandense.[15]
Com a letra do republicano Serafim Joaquim de Alencastre, o hino
foi executado e cantado pela primeira vez na cerimônia de comemoração do
primeiro aniversário da Tomada de Rio Pardo. Hoje a música do hino é a mesma,
mas foi composta outra letra, por Francisco Pinto da Fontoura, o Chiquinho
da Vovó, para se adequar aos novos tempos.
Cabe
ressaltar que a primeira composição do Hino Nacional da República Rio-grandense
destacava a mesma ideia dos discursos de Bento Gonçalves, de não ceder à paz
vergonhosa da deposição das armas:
“
|
Nobre povo rio-grandense. Povo de heróis, povo
bravo!
Conquistaste a independência. Nunca
mais serás escravo.
|
”
|
Marinha Farroupilha
A
Marinha Imperial Brasileira controlava os principais meios de comunicação da
Província, a Lagoa dos Patos, entre Porto Alegre, Pelotas e Rio Grande,
e a maior parte dos rios navegáveis. Apesar disso era constantemente atacada
pelos farroupilhas, quando próximos aos barrancos dos rios. Em 1°
de fevereiro de 1838,
uma tropa de dois mil farrapos e uma bateria de artilharia conseguiram atacar
de surpresa duas canhoneiras e um lanchão no rio Caí,
matando quase todos os marinheiros e aprisionando um dos comandantes.[21]
O
fator estratégico de maior efeito a favor do Império era o bloqueio da barra da Lagoa dos
Patos, único acesso ao porto de Rio Grande, por onde desembarcavam
continuamente os reforços imperiais, e ao mar. A República, na segunda parte do
confronto procurava manter a supremacia conquistada na região geográfica da serra
do sudeste do Rio Grande do Sul, de relevo irregular e com apenas um rio que
comunicava com a Lagoa dos Patos, o Camaquã.
Foi
preciso engendrar uma manobra incomum para conquistar um ponto que pudesse
ligar o Rio Grande dos farrapos com o mar. Este ponto era Laguna, em Santa
Catarina. O primeiro passo era constituir a Marinha Rio-Grandense. Giuseppe Garibaldi conhecera Bento
Gonçalves ainda em sua prisão, no Rio de Janeiro, e obteria dele uma carta
de corso para aprisionar embarcações imperiais.[15]
Em 1° de setembro de 1838, Garibaldi foi
nomeado capitão-tenente, comandante da marinha Farroupilha[18].
Foi
criado um estaleiro,
junto a uma fábrica de armas e munições em Camaquã, na
estância de Ana Gonçalves, irmã de Bento Gonçalves[18].
Lá Garibaldi coordenou a construção e o armamento de dois lanchões de guerra.
Ao mesmo tempo, Luigi Rossetti foi a Montevidéu, buscar a ajuda de Luigi
Carniglia e outros profissionais indispensáveis.[18]
Após algumas semanas, estava completa a equipagem de mestres e operários.
Alguns marinheiros vieram de Montevidéu e outros foram recrutados pelas
redondezas.[15][18]
Os
imperiais, informados dos planos farrapos, atacaram o estaleiro de Camaquã,
comandados por Francisco Pedro de Abreu, o Chico Pedro,
também conhecido por Moringue. Eram mais de uma centena de homens,
cercando o galpão com 14 trabalhadores entrincheirados. Giuseppe Garibaldi
comanda a resistência durante horas. Quase ao anoitecer, Moringue precipitou-se
do esconderijo e levou um tiro no peito, sendo recolhido por seus companheiros,
fugindo tão rapidamente quanto chegaram.
Garibaldi liderando a expedição à Laguna (Lucílio de Albuquerque).
O Seival
Terminada
a construção dos barcos e lançados à água, os lanchões Seival e
Farroupilha, cortando as águas da Lagoa
dos Patos, acuados pela armada de John
Grenfell, não tiveram muito sucesso: capturaram alguns barcos de comércio
desprevenidos, em lagoas ou rios longe da armada imperial.[21]
Surgiu, então, o plano de levar os barcos pela Lagoa dos Patos até o Rio
Capivari e, dali, por terra, sobre rodados especialmente construídos para
isso, até a barra do Tramandaí, onde os barcos tomariam o mar. Assim foi feito,
mas não sem dificuldades.
Os
Farrapos, despistando a armada imperial, conseguiram enveredar pelo estreito do
rio
Capivari e passaram os barcos a terra em 5 de julho
de 1839.[18]
Puxando sobre rodados, os dois lanchões artilhados, com cem juntas de bois[6],
atravessaram ásperos caminhos, pelos campos úmidos - em alguns trechos
completamente submersos, pois era inverno, tempo feio com chuvas e ventos,
tornando o chão um grande lodaçal. Cada barco tinha dois eixos e, naturalmente,
quatro rodas imensas, revestidas de couro cru[6].
Piquetes corriam os campos entulhando atoleiros, enquanto outros cuidavam da
boiada[6].
Almirante da Marinha Imperial Frederico
Mariath
Levaram
seis dias até a Lagoa Tomás José[18],
vencendo 90 km[5]
e chegando a 11 de julho[6].
No dia 13, seguiram da Lagoa Tomás José à Barra do Rio
Tramandaí, no Oceano Atlântico, e, no dia 15, lançaram-se ao mar com sua
tripulação mista de 70 homens. O Seival, de 12 toneladas, era comandado
pelo norte-americano John Griggs, conhecido como "João Grandão", e
o Farroupilha, de 18 toneladas, comandado por Garibaldi - ambos armados
com quatro canhões de doze polegadas, de molde "escuna"[6].
Por fim, a 14 de julho de 1839, os lanchões
rumaram a Laguna
para atacar a província vizinha. Na costa de Santa
Catarina, próximo ao rio
Araranguá, uma tempestade pôs a pique o Farroupilha, salvando-se
milagrosamente uns poucos farrapos, entre eles o próprio Garibaldi.
Enquanto
isto, Grenfell continuava a caça à marinha farroupilha. Com o vapor Águia
e diversas canhoneiras e lanchões, atacou a base de Camaquã e apreendeu três
lanchões e duas lanchas; mas era tarde, pois ali teve a notícia de que
Garibaldi já estava longe, a caminho de Laguna.[21]
A República Juliana
Davi Canabarro, presidente da República Juliana (1839).
Bandeira da República Juliana
Com a
chegada da marinha farroupilha a Santa Catarina, unindo-se às tropas do
exército, sob o comando geral de David
Canabarro, foi possível preparar o ataque a Laguna por terra e pela água. A
marinha farroupilha entrou através da Lagoa de Garopaba do Sul, passando pelo rio
Tubarão, e atacou Laguna por trás, surpreendendo os imperiais que esperavam
um ataque de Garibaldi pela barra de Laguna e não pela lagoa. Garibaldi tomou
um brigue e dois lanchões, enquanto somente o brigue-escuna Cometa
conseguiu escapar para o mar.[21]
Laguna foi tomada, com ajuda do próprio povo lagunense, a 22 de julho
de 1839. A 29 deste
mês proclamou-se a República Juliana[11],
feito um país independente, ligada à República Rio-Grandense pelos laços do
confederalismo.
Após
conquistar Laguna, as forças farroupilhas continuaram rumo ao norte,
perseguindo as tropas imperiais, avançando cerca de 70 km até a planície do rio
Maciambu. O avanço foi contido devido a um entrincheiramento das forças
imperiais, protegidas pela geografia do Morro dos Cavalos, que dificultava o
acesso das tropas farrapas e lhes bloqueava o avanço para o ataque a Desterro,
hoje Florianópolis.[31]
Com a
tomada de Laguna, praticamente metade da província catarinense ficou em mãos
republicanas. A incorporação da vila de Lages, também sob controle rebelde, ao
novo estado, levou o território da República Juliana a se estender do extremo
meridional até o planalto catarinense.[31]
Foi então organizada a República Juliana, sendo convocadas eleições para
constituição do governo. Canabarro ficou à frente do governo da nova república
até 7 de
agosto de 1839, quando foi convocado o colégio eleitoral. Foram eleitos
para presidente o tenente-coronel Joaquim Xavier Neves e para vice o padre Vicente Ferreira dos Santos
Cordeiro. Como Xavier Neves estava em São José bloqueado pelas forças imperiais, o
padre Vicente Cordeiro assumiu a presidência.[31]
Os
farroupilhas ainda fizeram incursões navais mais ao norte, chegando a atacar a
barra de Paranaguá
em 31
de outubro de 1839.
Uma escuna e um lanchão farroupilhas capturaram a sumaca Dona Elvira,
porém foram combatidos pelos canhões da fortaleza e
obrigados a retroceder. A escuna recuou rumo ao norte, porém o lanchão, mais
pesado, por ali parou e foi capturado por uma lancha com vinte homens comandada
pelo alferes Manuel Antônio Dias, sendo a lancha Dona Elvira recuperada.[32]
Retrato de Anita Garibaldi (1839).
O
império impôs um bloqueio naval, que buscava estrangular a república
economicamente. Garibaldi ainda conseguiu furar o bloqueio com três barcos,
capturou dois navios de comércio, trocou tiros com o brigue-escuna Andorinha
e tomou o porto de Imbituba.[21]
Alguns dias mais tarde retornou a Laguna, em 5 de
novembro.[21]
Pouco
tempo depois o império reagiu com força total, comandado pelo General
Andréa, comandante de armas de Santa Catarina[23],
com mais de três mil homens atacando por terra. Enquanto isto, por mar, o
Almirante Imperial Frederico Mariath, com uma frota de 13 navios,
melhor equipados e experientes, iniciou a batalha naval de Laguna. Garibaldi
fundeou convenientemente seus cinco navios, que se bateram contra os imperiais
valentemente, mas sem chances de vitória.[21]
Nos navios farroupilhas nenhum comandante ou oficial escapou com vida.[21]
O próprio Garibaldi, vendo a derrota iminente, queimou seu navio, a escuna Libertadora,
e se juntou à tropa de Canabarro[21],
que preparou a retirada de Laguna[6].
Era o fim da marinha farroupilha.
Os
imperiais retomaram Laguna a 15 de
Novembro de 1839.
Garibaldi fugiu com Ana, que se tornaria conhecida como Anita
Garibaldi, uma mulher lagunense casada, cujo esposo alistara-se no exército
imperial, abandonando-a, um escândalo para a época. Anita veio a ser sua
companheira de todos os momentos, lutando lado-a-lado com Garibaldi tanto nos
pampas gaúchos como na Itália, onde é considerada heroína.
Os campos de Lages
Em 9 de
março de 1838 os
farroupilhas invadiram Lages, anexando a vila à República Rio-Grandense, com o apoio
de alguns fazendeiros locais, fato que havia causado grande júbilo entre os
revolucionários: era a primeira conquista farrapa fora do Rio Grande do Sul.[33]
Depois
das queda de Laguna, as tropas farrapas tomaram o caminho de Lages para
retornar ao Rio Grande do Sul. Enquanto isso, o governo imperial havia decidido
enviar um contingente de tropas ao sul pelo interior, com a missão de retomar Lages e depois
auxiliar contra o cerco de Porto Alegre pelos farrapos[33].
Em Rio Negro reuniram-se 1.500 homens, vindos do
Rio de Janeiro, Curitiba,
Paranaguá,
Antonina e Campo
do Tenente, deslocando-se para Santa Cecília, onde acamparam em 25 de
outubro de 1839.[33]
Travando
pequenos combates com piquetes farroupilhas em novembro, através dos Campos dos
Curitibanos e Campos Novos, chegaram a Lages, onde retomaram
a vila. Dali uma parte da coluna do brigadeiro Francisco Xavier da Cunha
decidiu seguir em direção ao Rio Pelotas, para invadir o Rio Grande do Sul[33].
Os farrapos,
derrotados em Lages, se reuniram em um entreposto alfandegário, para cobrança
de impostos sobre as tropas de gado e mulas que vinham de Viamão e
seguiam para Sorocaba,
conhecido como Santa Vitória.[33]
O
brigadeiro Francisco Xavier da Cunha foi informado e para lá dirigiu-se, com
seus dois mil homens. Foi surpreendido em 14 de
dezembro de 1839
por Teixeira
Nunes que, com sua cavalaria, conseguiu dividir a tropa legalista e o fez
retroceder. Em um renhido combate as tropas legalistas foram derrotadas.[23]
O brigadeiro, ferido e protegido por alguns oficiais, tentou escapar e, ao
cruzar o Rio Pelotas, morreu afogado.[33]
Os
farroupilhas retomaram Lages novamente, mas as tropas legalistas foram
reforçadas por uma divisão vinda de Cruz Alta, sob o comando do coronel Antônio de Melo Albuquerque, o
"Melo Manso".
Garibaldi
e Teixeira Nunes, pressentindo um ataque, dividiram suas tropas, uma partindo
para o norte, onde, perto do Rio Marombas encontrou uma tropa legalista superior em
12
de janeiro de 1840.
Os republicanos foram dizimados e, dos 500 iniciais, menos de 50 conseguiram
retornar a Lages e depois voltar ao Rio Grande do Sul.[33]
1840: os farrapos perdem território
Até o
ano de 1840, podia-se perceber um período de ascensão farroupilha, com várias
vitórias no campo militar.[12]
Após esse período, é perceptível uma situação de decadência, iniciada com a
queda de Laguna[17].
O General Andréa, que havia retomado Laguna, logo é nomeado o novo Presidente
Imperial da Província de São Pedro do
Rio Grande do Sul e Comandante do Exército Imperial na Província.[23]
Também começaram as desavenças políticas entre os farroupilhas, com
consequências funestas no futuro.[15]
No
começo de 1840, os
farroupilhas controlavam boa parte do interior, mas não tinham uma saída para o
mar.[20]
Além disso, enquanto as tropas rio-grandenses se concentravam no cerco de Porto
Alegre, Caçapava, a capital da República desde 14
de fevereiro de 1839[34],
considerada inexpugnável por causa do difícil acesso[35],
foi invadida pelos imperiais. Instalou-se a capital em Alegrete, em 28 de
março.[34].
No
mesmo ano, no combate de Tabatingaí, João Propício Mena Barreto e suas tropas
derrotaram 250 farroupilhas, prendendo Onofre
Pires, levado para Porto Alegre[17].
Em Julho os Farrapos perderam São Gabriel. Francisco Pedro de Abreu, o Moringue,
surpreendeu Antônio de Sousa Neto, quase fazendo-o prisioneiro.
Finalmente Bento Gonçalves, em campanha pela conquista de São José do Norte junto com Domingos Crescêncio de Carvalho e
1.200 homens, travou duríssima batalha de quase nove horas, tomando a cidade por
pouco tempo. A reação vinda de Rio Grande expulsou os farrapos embriagados[17].
Estes
insucessos e alguns desentendimentos com Bento Gonçalves[23]
deram pretexto a Bento Manuel, tido como fiel da balança[36]
do confronto, para abandonar os revolucionários. Escreveu ao Ministro da Guerra
da República, José Mariano de Mattos, demitindo-se do exército, ao mesmo tempo
em que escrevia para o presidente da província pedindo uma anistia para si e
alguns amigos.[23]
Anistiado, foi refugiar-se no Uruguai, desiludido com o sistema republicano
que, segundo ele, "parece em teoria governo dos anjos, porém na prática
nem mesmo para diabos serve".[20]
Alegoria Farroupilha, guache do século XIX. Acervo do Museu Júlio de Castilhos
Bento
Gonçalves, ainda no ano de 1840, em decorrência dos insucessos, acenou ao
Império com a possibilidade de acordo. Bento pediu a Álvares
Machado salvo-condutos para que companheiros seus pudessem atravessar
impunemente os locais conquistados pelo império, a fim de acertar com os chefes
imperiais os detalhes de uma rendição coletiva dos Farrapos. Levavam,
efetivamente, uma carta com este desígnio. Porém, havia uma outra mensagem oral
a ser dada àqueles líderes, que não podia ser escrita. A manobra, porém, foi
tão bem pensada e executada que enganaria até mesmo seus companheiros de luta,
e motivou uma carta de reprovação escrita por Domingos José de Almeida, então Vice-Presidente
e Ministro da Fazenda da República Rio-Grandense.
Os
combates continuaram em diversas frentes: em novembro de 1841, Chico Pedro
fez 20 prisioneiros e tomou 400 cavalos dos Farroupilhas, perto de São Gabriel;
em Rincão Bonito
o coronel João Propício Mena Barreto provocou 120
mortes, fez 182 prisioneiros e tomou 800 cavalos; em 20 de
janeiro de 1842
Chico Pedro, atacado por Bento
Gonçalves e 300 homens, derrotou-o, provocando 36 mortes, 20 prisioneiros e
capturando toda a bagagem, sofrendo somente 3 mortes e 7 feridos.[26]
Uma Assembleia Constituinte havia sido
convocada em 10 de fevereiro de 1840, porém manobras de
Bento Gonçalves, que não queria perder poderes, levaram a que somente em 1842 fosse promulgada a
Constituição da República[17],
o que deu um ânimo momentâneo à luta.
Reforços Liberais
O fim
das rebeliões em outras províncias, como a Sabinada na Bahia e a Revolução Liberal de 1842 em São Paulo,
trouxeram novos reforços às tropas farrapas. Entre eles, vieram da Bahia:
- Daniel Gomes de Freitas (signatário
depois do tratado de paz)
- coronel Manoel Gomes Pereira, que
financiou a fuga de Bento Gonçalves. Saiu da Bahia no início de janeiro de
1838, estava em Montevidéu em missão de recrutamento quando a Sabinada
acabou e dali foi procurar seus amigos rio-grandenses, sendo bem acolhido
e presenteado por Bento Gonçalves com o posto de coronel, servindo no
Estado Maior. Veio com uma fortuna arrecadada para comprar barcos de
guerra, que jamais navegaram, mas adquiriu uma chácara em Montevidéu,
depois de cobrar de Bento o dinheiro que tinha lhe emprestado.[37].
- João Rebelo de Matos, Bento José
Roiz, José Pinto Ribeiro, João Francisco Régis, todos militares
transferidos da Bahia e envolvidos na Sabinada e
que se rebelaram na Fortaleza da
Barra do Sul, na Ilha de Santa Catarina, entregando a fortaleza aos
Farrapos e se juntando ao movimento, em 1839.[31]
- Francisco José da Rocha, teria vindo
da Bahia acompanhando Bento Gonçalves, era a maior autoridade maçônica na
Província; sua promoção a tenente-coronel
pelos farroupilhas foi um dos motivos que levaram Bento
Manuel a abandonar o lado republicano.[38]
- João Rios Ferreira
De São
Paulo veio Rafael Tobias de Aguiar[12],
chefe da Revolução Liberal de 1842, que foi pouco
depois preso em Palmeira das Missões e levado para a Fortaleza
da Laje, no Rio de Janeiro.
Por
outro lado, o fim destas outras rebeliões também liberou as tropas do exército
brasileiro para concentrarem todos seus esforços contra os farroupilhas.
O duelo entre Bento Gonçalves e Onofre Pires
A
República Rio-Grandense não ficou isenta das disputas pelo poder. Em dezembro
de 1842, quando se instalou a Assembleia
Constituinte Farroupilha, as divergências se exteriorizaram, contrapondo a maioria
de Bento Gonçalves e a minoria de Antônio Vicente da Fontoura[39].
Isto levou a que o projeto de Constituição, publicado em fevereiro de 1843,
tivesse prejudicada a sistematização das ideias de todos aqueles que ainda
estavam na revolução ou a apoiavam[39].
Em 4 de agosto
de 1843, Bento
Gonçalves renunciou à presidência da República Rio-grandense por conta de uma
campanha de intrigas, assumindo seu vice Gomes
Jardim.[15]
Lançou ao mesmo tempo um manifesto dizendo-se acometido de uma enfermidade pulmonar,
que talvez já o estivesse incomodando, e incitou os farroupilhas a se unir em
torno do novo presidente. Passou em seguida a comandar uma divisão do Exército
Rio-Grandense.
Os
opositores, entre eles o deputado Antônio Vicente da Fontoura, induziram Onofre
Pires a destratar Bento Gonçalves, acusando-o do assassinato de Paulino da Fontoura.[15]
Onofre foi por isso desafiado por Bento para um duelo, realizado em 27
de fevereiro de 1844.
Durante o duelo Onofre foi ferido no braço direito e, apesar de socorrido por
Bento, faleceu dias depois, por complicações advindas do ferimento.[15]
Negociações de paz e a batalha de Porongos
Um dos canhões usados pelos Farroupilhas. Permaneceu até 1926 no fundo do
riacho Santa Isabel, em Camaquã, quando foi recuperado junto com outros e
passou ao acervo do Museu Júlio de Castilhos
A
primeira negociação de paz ocorreu com a nomeação de Francisco Alves Machado para presidente da
província, o qual ofereceu a Bento Gonçalves anistia plena para negociar um
tratado. Bento respondeu em carta, a 7 de
dezembro de 1840,
propondo que: as dívidas contraídas pela república fossem pagas pelo governo
imperial, os escravos que haviam sido alistados como soldados republicanos
fossem libertados e que os oficiais revolucionários fossem garantidos em seus
postos, quando aproveitados em serviço da Guarda
Nacional. Para melhor firmar o tratado, Bento Gonçalves solicitou uma
conferência com o presidente, porém Alvares Machado negou-a por saber que os
farrapos tentavam aliciar à sua causa diversos legalistas, como o coronel Manduca
Loureiro e o coronel João da Silva Tavares. A recusa da
conferência importou em suspensão da anistia e consequente continuação da luta.[40]
O
sistema de guerrilha e a troca constante de presidentes e comandantes de armas
prolongaram a luta até que o Barão
de Caxias (futuro Duque) foi nomeado Presidente da Província e Comandante
Supremo Imperial em 9 de novembro de 1842[17][20],
reorganizando o exército e chamando para seu Estado Maior a Bento Manuel
Ribeiro[23],
que tinha se recolhido para o Uruguai[20].
O barão empregava toda sua força de 12.000 homens[20],
conhecimento, inteligência e experiência para minar a relativa supremacia
farrapa no interior, que contava com apenas 3.500 homens[20].
Entre as várias ações, iniciou uma campanha de estrangulamento da economia da
República, atacando as cidades da fronteira que permitiam o escoamento da
produção de charque
para Montevidéu
e Laguna[20],
comprando cavalos para impedir que os Farrapos tivessem montaria [17]
e reativando o comércio.
Lima e
Silva, porém, não conseguiu atrair os farrapos para uma batalha campal
decisiva. O exército republicano, sabendo de sua inferioridade numérica e de
armamentos, evitou o combate direto, tendo a campanha permanecido como uma
série de pequenos combates e escaramuças[20];
quando perseguidos, os farroupilhas se refugiavam no Uruguai[20].
Em
1844, Fructuoso de Rivera propôs intermediar a paz entre legalistas e
republicanos. Manuel Luís Osório foi enviado ao acampamento de
Rivera, onde encontrou-se com Antônio Vicente da Fontoura, para avisar
que Lima e Silva recusava a proposta de paz [17],
mas que poderia haver tratativas com o governo, porém sem a presença de
terceiros[20]
. Vicente da Fontoura foi enviado à corte para discutir a paz.
Luís
Alves de Lima e Silva recebeu instruções do Império, que temia o avanço de Rosas sobre o
território litigante, para propor condições honrosas aos revoltosos, como a
anistia dos oficiais e homens, sua incorporação ao Exército Imperial nos mesmos
postos e a escolha do Presidente da Província pela Assembleia Provincial,
taxações sobre o charque importado do Prata.[15]
Entretanto,
uma questão permanecia insolúvel, a dos escravos libertos pela República para
servir no exército republicano. Para o Império Brasileiro, era inaceitável
reconhecer a liberdade de escravos dada por uma sedição, embora anistiasse os
líderes da mesma revolta.
Em
novembro de 1844, estavam todos em pleno armistício. Suspensão de armas,
condição fundamental para que os governos pudessem negociar a paz, levando ao
relaxamento da guarda no acampamento da curva do arroio Porongos. Canabarro
e seus oficiais imediatos foram a uma estância próxima visitar a mulher viúva
de um ex-guerreiro farrapo e o coronel Teixeira
Nunes e seu corpo de Lanceiros Negros descansavam. Foi então que
apareceu Moringue,
de surpresa, quebrando o decreto de suspensão de armas. Mesmo assim o corpo de Lanceiros
Negros, cerca de 100 homens de mãos livres, pelearam, resistiram e
bravamente lutaram até a aniquilação, em uma posição de difícil defesa. Além
disso, foram presos mais de 300 republicanos entre brancos e negros, inclusive
35 oficiais.
O
general Canabarro, recuperado, reuniria ainda todo o restante de seu exército,
cerca de 1.000 homens, e atacaria Encruzilhada a 7 de
dezembro de 1844,
tomando-a e mostrando assim que a sua intenção não era entregar-se.
Paz do Poncho Verde
Por
fim, a 1° de março de 1845, assinou-se a paz:
o Tratado de Poncho Verde ou Paz do Poncho Verde[11],
após quase dez anos de guerra que teria causado 47.829 mortes[26].
Entre suas principais condições estavam a anistia plena aos revoltosos, a
libertação dos escravos que combateram no Exército piratinense e a escolha de
um novo presidente provincial pelos farroupilhas.[15]
O cumprimento parcial ou integral do tratado até hoje suscita discussões. A
impossibilidade de uma abolição da escravatura regionalmente restrita, a
persistência de animosidade entre lideranças locais e outros fatores administrativos
e operacionais podem ter ao menos dificultado, senão impedido o cumprimento
integral do mesmo. Tal discussão é remetida para o artigo principal deste assunto.
Dos
escravos sobreviventes, alguns acompanharam o exército do general Antônio Neto
em seu exílio no Uruguai,
outros foram incorporados ao Exército Imperial e muitos foram vendidos novamente
como escravos no Rio de Janeiro.
A
atuação de Luís Alves de Lima e Silva foi tão nobre e correta para com os
oponentes que a Província, novamente unificada, o indicou para senador. O
Império, reconhecido, outorgou ao general o título nobiliárquico de Conde de
Caxias (1845). Mais
tarde, (1850), com a iminência da Guerra contra Rosas, seria indicado presidente
da Província de São Pedro do Rio
Grande.
Mídia
- Notas sobre o "Hymno republicano
rio-grandense de 1835": A partitura manuscrita pertence ao acervo do Museu Júlio de Castilhos, Porto
Alegre, e nela consta a inscrição "Este hino foi solfejado
pelo m...(palavra ilegível, interpretada pelos técnicos do Museu como ministro)
Augusto Pereira Leitão, revolucionário de 35". O acorde de 7ª
na abertura foi realizado como um arpeggio à guisa de introdução.
Foram alterados acidentes nos compassos 14 e 18 que indicavam Lá#,
incongruente com a clave de Fá maior (talvez erro de cópia), e
acrescentado um # no Fá do baixo, que constava natural contra um Fá# da
melodia acima, na falsa preparação para Sol menor. Também uma nota do
baixo do segundo compasso foi alterada de Lá para Sib por
aparentemente
Postado por Demersom da Rosa
Domingues
Escola Sesi-Eraldo Giacobbe
8 fase
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